Por Débora Gallas Steigleder *
Conforme a terceira edição do Atlas da Notícia, publicada no final de 2019, aproximadamente 75% dos municípios da Região Sul do Brasil são enquadrados como desertos ou quase desertos de notícias, onde não há quaisquer veículos jornalísticos ou, na melhor das hipóteses, existem apenas um ou dois deles. Viamão, município vizinho à capital sul-riograndense, Porto Alegre, não está enquadrado enquanto deserto de notícias, pois possui dez veículos listados em pesquisa no realizada no site do projeto. No entanto, foi difícil encontrar textos jornalísticos sobre o tema escolhido para análise desta semana no Observatório: o projeto de implantação de aterro sanitário na área rural do município, nas proximidades da Aldeia Guarani Cantagalo e de propriedades de produção de alimentos orgânicos.
Proposto pela Prefeitura de Viamão no início de 2019, o projeto recebeu inúmeras críticas da população local, repercutidas à época por veículos regionais de grande expressividade, como os jornais Zero Hora e Correio do Povo. Pelo fato de a comunidade local seguir mobilizada contra o empreendimento e por conta do agendamento de uma consulta pública pela Prefeitura, realizada na última terça-feira, 14 de janeiro, era de se esperar que as mídias locais estivessem atentas aos desdobramentos desse debate público de relevância para o município. Porém, afora postagens de cidadãos e figuras públicas nas redes sociais, não localizamos cobertura jornalística sobre o acontecimento.
De acordo com busca na ferramenta Google Notícias no dia 15 de janeiro, a única menção de caráter jornalístico à audiência pública aparece em texto do jornal Brasil de Fato publicado em sete de janeiro. O foco da notícia, no entanto, é a aprovação do Projeto de Lei 185/2019, que obriga a aprovação legislativa para instalação de empreendimentos de aterro sanitário, reciclagem e manuseio de lixo no município. Em buscas realizadas individualmente nos portais de veículos locais e regionais, nenhuma menção à realização de audiência pública ou aos desdobramentos do debate sobre a instalação do aterro sanitário – assim como no site da Prefeitura Municipal de Viamão.
Na página do Facebook Correio Viamonense, a qual conta com mais de 12 mil curtidas e se intitula enquanto empresa de mídia com sede em Viamão, há um post com foto da audiência pública e texto contrário ao projeto. Embora não apareça no Atlas da Notícia e seu conteúdo possa não ser caracterizado enquanto jornalismo por replicar textos e imagens sem indicar fonte ou por compartilhar postagens de perfis pessoais, por exemplo, é possível crer que tal página seja resultado de uma ação popular a fim de repercutir assuntos de interesse público. Isto porque, em comparação, a página do Diário de Viamão, veículo listado no Atlas da Notícia e que conta com mais de 23 mil curtidas, não publica quaisquer atualizações desde o dia 4 de janeiro.
Na série O jornalismo no Brasil em 2020, o fortalecimento do jornalismo local foi apontado por Nina Weingrill como uma urgência frente ao crescimento dos desertos de notícias. E são iniciativas da própria comunidade que podem suprir o vazio informativo, ainda que soluções para a sobrevivência financeira precisem ser testadas e aprimoradas. No caso de temas ambientais, esta necessidade é ainda mais evidente. Pautas relevantes para atuais e futuras gerações de comunidades heterogêneas como a população rural de Viamão, em vias de ser diretamente impactada pelo empreendimento do aterro sanitário, seguem invisibilizadas no contexto de crise do jornalismo enquanto instituição e modelo de negócios.




