Dia Mundial do Meio Ambiente vira desagravo e especulação sobre Marina Silva

Imagem: Lula Marques/Agência Brasil

Por Janaína C. Capeletti*

A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima foi o foco das notícias publicadas pelos grandes portais, na celebração do Dia Mundial do Meio Ambiente, no último dia 5 de junho. O motivo são os recentes acontecimentos, como a medida provisória que organiza os ministérios do governo, aprovada pelo Congresso Nacional, que retirou a gerência da Agência Nacional de Águas (ANA) e o Cadastro Ambiental Rural (CAR) da pasta do Meio Ambiente. Além da objeção de Marina Silva ao projeto da Petrobras de exploração de petróleo na foz do rio Amazonas, no estado do Amapá, que causou conflitos dentro do próprio governo.

Em cerimônia realizada no Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ministra apresentaram a quinta fase do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm) que prevê a ampliação do cerco jurídico e institucional contra desmatadores e incentivos econômicos a quem desenvolver agricultura sustentável. Marina Silva também fez um pronunciamento em rede nacional pela data, que da mesma forma que o evento no Planalto, foi amplamente divulgado, com alguns veículos publicando o discurso na íntegra.

Ao analisar os títulos das matérias, percebe-se que parte das notícias especulam sobre o poder político da ministra e alguns chegam a se aproximar da “fofoca”, ao estilo sensacionalista.

O jornal O Globo publicou “Após ver ministério perder atribuições, Marina deve ser prestigiada por Lula no Dia do Meio Ambiente“, na mesma linha a coluna de Matheus Leitão, da Veja fez duas publicações “Como Lula ganhou tempo ao lado de Marina … e do cacique Raoni” e “A resposta de Marina Silva“, sobre o pronunciamento da ministra. O jornal Brasil de Fato, com a cartola de página intitulada Apagando Fogo, publicou a seguinte manchete “Dia do Meio Ambiente: com Marina, governo prepara anúncio de ações para área nesta segunda (5)” e subtítulo “Medidas devem ser resposta as aprovações do Congresso que enfraqueceu ministério e pôs em xeque demarcação de terras”. A editoria Último Segundo, do portal IG, destacou ” Plano de Marina Silva quer embargar metade de áreas desmatadas“. O portal Terra seguiu a linha: “Plano Amazônia de Lula e Marina propõe interdição de metade da área desmatada no país“.

Na Folha de S. Paulo, a abordagem é semelhante,  mas com um tom de ironia: “Em dia de incentivo para carro, Marina diz que Lula fará transição histórica para sustentabilidade“. No mesmo veículo, “Marina chama esvaziamento de ministério de ‘retrocesso’“. O jornal Estadão segue “Lula promete governo duro contra quem destruir a Amazônia depois de ministério de Marina ser esvaziado“.

Contudo, alguns veículos trazem títulos que se pretendem neutros ou que dão voz à ministra, como no Correio Braziliense “Marina: jamais subordinaria minha permanência no governo a uma decisão externa“, e no O Globo “Em cerimônia com Lula, Marina diz que esvaziamento do meio ambiente feito pelo Congresso é retrocesso e vai na contramão“. O portal Poder 360 sobre a mesma declaração da ministra publicou ” Não posso concordar com MP da Esplanada, diz Marina Silva“.

Os títulos têm grande poder de persuasão, pois é por meio deles que o leitor seleciona o que vale a pena ou não ler e, muitas vezes, compartilhar com outros leitores. Burnett (1991, p. 43) considera o título o elemento mais importante da notícia porque “[…] sem um título atraente o leitor não chega sequer ao lead”, o parágrafo de abertura que traz as principais informações para contextualizar o acontecimento. Na internet, essa importância se afirma com peso ainda maior, porque o leitor só chega ao lead e, consequentemente, à notícia, se clicar no título. Como a mídia detém o poder de agendamento, de silenciamento e de enquadramentos dos fatos, é importante que se verifique os efeitos de sentido produzidos por esses processos discursivos jornalísticos, dada sua influência na formação da opinião pública.

Nota-se que o objetivo desta breve análise é de avaliar apenas os títulos das matérias, não o conteúdo das notícias. Pelos títulos coletados percebe-se uma tendência da grande mídia a enfraquecer e/ou questionar o papel da ministra na condução das políticas públicas de proteção ambiental. Em um momento crucial na reconstrução do desmonte realizado pelo governo passado, as pressões sofridas por Marina Silva são uma prova de fogo para a pauta ambiental brasileira.

*Jornalista, mestranda em Comunicação na UFRGS, integrante do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS). E-mail: janacapeletti@gmail.com.

Referências:

BURNETT, Lago. A língua envergonhada. Rio: Nova Fronteira, 1991.

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Dia Mundial do Meio Ambiente: por pautas menos catastrofistas

Imagem: Captura de tela – Notícia publicada no site da Revista Galileu
*Eloisa Beling Loose

Dentre as muitas efemérides que servem de gancho para a produção jornalística, no dia 5 de junho temos uma dedicada ao meio ambiente. O Dia Mundial do Meio Ambiente foi criado pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1972, e busca chamar a atenção para a importância da sustentabilidade da vida de todas as espécies – inclusive a nossa – no planeta.

O assunto está mais presente na pauta em razão do volume de problemas ambientais que nos cercam (poluição de ar e água, desmatamento, contaminação por agrotóxicos, rompimento de barragens de rejeitos de mineração, flexibilização das políticas ambientais, extinção de espécies, etc.) e seu tratamento jornalístico costuma ser desolador. O destaque em aspectos negativos tende a gerar uma percepção de que não há mais saídas.

Na última semana, a data foi lembrada por muitos veículos jornalísticos e a “fórmula do choque”, tentando despertar as pessoas sobre o cenário pessimista no qual nos encontramos, foi repetida inúmeras vezes. A matéria publicada no site da Revista Galileu, Mudanças climáticas podem acabar com a civilização até 2050, diz estudo, por exemplo, celebra o dia 5 de junho lembrando que estamos a caminho da extinção da espécie humana. A partir de um relatório do Centro Nacional de Descoberta do Clima da Austrália, o texto indica que as mudanças climáticas podem colapsar a nossa civilização até 2050, tornando o mundo um caos, em razão das condições cada vez mais adversas decorrentes das consequências climáticas.

A notícia da Galileu aponta também o que deveria ser feito. Segundo o documento que é sua única fonte: é necessário alterar a matriz produtiva mundial para que ela seja de zero carbono e pensar mais no planejamento para lidar com cenários extremos. É claro que isso envolve um alto investimento de recursos e um empenho coletivo dos países em priorizar a vida (e não só daqueles que podem pagar por isso). Esse esforço, até hoje, apesar das muitas evidências, não tem sido realmente efetivo, porém a matéria da Galileu não oferece ao leitor uma discussão das tentativas e explicações do porquê isso ainda acontece.

O Acordo de Paris, compromisso negociado por 195 países, em 2015, e que entrará em vigor somente no próximo ano, pretende manter o aumento da temperatura média global em menos de 2°C acima dos níveis pré-industriais. Os esforços, porém, são para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. A grande questão é que, como explicita o texto, os piores cenários tendem a ser subestimados. E qual a razão de se achar que não há urgência em uma mudança radical nos nossos modos de vida?

Ainda que os relatos jornalísticos sejam sempre recortes da realidade, percebe-se uma recorrência de notícias com fonte única e quase nenhuma contextualização. Além disso, a ênfase nos aspectos mais catastrofistas inibe o foco para a ação, para aquilo que devemos fazer hoje. Soluções de escala global são bem-vindas, mas o enfrentamento deve ocorrer em todas as esferas. Considerando todos os efeitos que já sentimos na pele e as previsões dos cientistas, adotar comportamentos e práticas diárias associadas às baixas emissões de gases de efeito estufa é um imperativo.

Quando a imprensa trata do futuro como algo que, em breve, deixará de existir, está sendo contraproducente, pois repercute a ideia de que não há muita coisa a ser feita. Ao entender o jornalismo como uma prática profissional comprometida com o interesse público, seu papel é justamente dar visibilidade às ações e projetos que estão trabalhando em prol de caminhos que garantam o cuidado com o meio ambiente, indispensável para nossa sobrevivência. Que o Dia Mundial do Meio Ambiente possa ser comemorado com enfrentamento e que, em breve, não seja preciso ter uma data para nos lembrar o óbvio: não podemos destruir o ambiente do qual dependemos para viver.

*Jornalista, mestre em Comunicação e Informação, e doutora em Meio Ambiente e Desenvolvimento. Vice-líder do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS).