Dia Mundial do Meio Ambiente: por pautas menos catastrofistas

Imagem: Captura de tela – Notícia publicada no site da Revista Galileu
*Eloisa Beling Loose

Dentre as muitas efemérides que servem de gancho para a produção jornalística, no dia 5 de junho temos uma dedicada ao meio ambiente. O Dia Mundial do Meio Ambiente foi criado pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1972, e busca chamar a atenção para a importância da sustentabilidade da vida de todas as espécies – inclusive a nossa – no planeta.

O assunto está mais presente na pauta em razão do volume de problemas ambientais que nos cercam (poluição de ar e água, desmatamento, contaminação por agrotóxicos, rompimento de barragens de rejeitos de mineração, flexibilização das políticas ambientais, extinção de espécies, etc.) e seu tratamento jornalístico costuma ser desolador. O destaque em aspectos negativos tende a gerar uma percepção de que não há mais saídas.

Na última semana, a data foi lembrada por muitos veículos jornalísticos e a “fórmula do choque”, tentando despertar as pessoas sobre o cenário pessimista no qual nos encontramos, foi repetida inúmeras vezes. A matéria publicada no site da Revista Galileu, Mudanças climáticas podem acabar com a civilização até 2050, diz estudo, por exemplo, celebra o dia 5 de junho lembrando que estamos a caminho da extinção da espécie humana. A partir de um relatório do Centro Nacional de Descoberta do Clima da Austrália, o texto indica que as mudanças climáticas podem colapsar a nossa civilização até 2050, tornando o mundo um caos, em razão das condições cada vez mais adversas decorrentes das consequências climáticas.

A notícia da Galileu aponta também o que deveria ser feito. Segundo o documento que é sua única fonte: é necessário alterar a matriz produtiva mundial para que ela seja de zero carbono e pensar mais no planejamento para lidar com cenários extremos. É claro que isso envolve um alto investimento de recursos e um empenho coletivo dos países em priorizar a vida (e não só daqueles que podem pagar por isso). Esse esforço, até hoje, apesar das muitas evidências, não tem sido realmente efetivo, porém a matéria da Galileu não oferece ao leitor uma discussão das tentativas e explicações do porquê isso ainda acontece.

O Acordo de Paris, compromisso negociado por 195 países, em 2015, e que entrará em vigor somente no próximo ano, pretende manter o aumento da temperatura média global em menos de 2°C acima dos níveis pré-industriais. Os esforços, porém, são para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. A grande questão é que, como explicita o texto, os piores cenários tendem a ser subestimados. E qual a razão de se achar que não há urgência em uma mudança radical nos nossos modos de vida?

Ainda que os relatos jornalísticos sejam sempre recortes da realidade, percebe-se uma recorrência de notícias com fonte única e quase nenhuma contextualização. Além disso, a ênfase nos aspectos mais catastrofistas inibe o foco para a ação, para aquilo que devemos fazer hoje. Soluções de escala global são bem-vindas, mas o enfrentamento deve ocorrer em todas as esferas. Considerando todos os efeitos que já sentimos na pele e as previsões dos cientistas, adotar comportamentos e práticas diárias associadas às baixas emissões de gases de efeito estufa é um imperativo.

Quando a imprensa trata do futuro como algo que, em breve, deixará de existir, está sendo contraproducente, pois repercute a ideia de que não há muita coisa a ser feita. Ao entender o jornalismo como uma prática profissional comprometida com o interesse público, seu papel é justamente dar visibilidade às ações e projetos que estão trabalhando em prol de caminhos que garantam o cuidado com o meio ambiente, indispensável para nossa sobrevivência. Que o Dia Mundial do Meio Ambiente possa ser comemorado com enfrentamento e que, em breve, não seja preciso ter uma data para nos lembrar o óbvio: não podemos destruir o ambiente do qual dependemos para viver.

*Jornalista, mestre em Comunicação e Informação, e doutora em Meio Ambiente e Desenvolvimento. Vice-líder do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS).
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