Imagem: Captura de tela da primeira página da reportagem de Zero Hora sobre mudanças climáticas
* Por Eloisa Beling Loose
A pauta ambiental é, na maioria das vezes, impulsionada por desastres, tragédias e prejuízos. Isso está relacionado não apenas aos acontecimentos mais visíveis ou concretos, que conseguem ser facilmente identificáveis pelos jornalistas na rotina de construir relatos sobre o presente, mas também aos critérios de noticiabilidade, que perpassam aspectos negativos – afinal, “notícias boas são notícias ruins”, pois são elas que prendem a atenção do público e geram desmembramentos (suítes), acarretando mais audiência e, consequentemente, maior faturamento. Inclusive existem estudos que indicam que as notícias com viés negativo são mais facilmente processadas e lembradas, chamando mais a atenção dos seres humanos (WENZEL, GERSON e MORENO, 2016). Contudo, especialmente quando falamos da cobertura da crise climática, não basta focar apenas no problema – que, dessa maneira, pode desencadear inércia ou apatia. Para que haja uma reação, sensibilização e, quiçá, uma mudança de atitude, é preciso que soluções ou boas práticas sejam visibilizadas pela imprensa.
Embora não seja tarefa difícil ampliar a abordagem dos relatos jornalísticos para além dos riscos e efeitos negativos – porque já existem muitas ações de enfrentamento em diferentes escalas -, a fragmentação típica da prática jornalística (especialmente dos veículos com produção em tempo real e diária) reproduz com muita frequência o enfoque unilateral dos problemas. É por isso que destaco, positivamente, a reportagem “O alerta climático ressoa no Sul”, de Itamar Melo, no jornal Zero Hora.
Além de expor a urgência e gravidade das mudanças do clima a partir do Rio Grande do Sul, a escala geográfica mais próxima do seu público-alvo, por meio de exemplos sentidos e acompanhados pelos gaúchos, o texto avança sobre o alarme da situação e dá espaço para apresentar medidas que podem ser feitas em nível individual e as adaptações necessárias no principal setor econômico do estado, o da agropecuária.
Ao tratar das respostas à emergência climática, tomando como gancho a repercussão dos jovens nas greves pelo clima, é possível visualizar uma perspectiva mais orientada para a ação, de um jornalismo que cumpre com a responsabilidade de informar e envolver as comunidades na resolução de seus problemas – diferente daquela cobertura centrada somente na negatividade, que provoca desânimo e desesperança. Ao pontuarmos que o Jornalismo Ambiental deve ser engajado, estamos sublinhando que é preciso construir relatos propositivos, que subsidiem de forma qualificada os cidadãos para suas tomadas de decisão.
Vale ressaltar também a consulta por fontes de informação que conhecem a realidade local, além de outras que contribuem com a contextualização de forma ampla. As mudanças climáticas são um fenômeno interdisciplinar e que se manifesta em múltiplos níveis, e os relatos jornalísticos devem refletir essa complexidade buscando ouvir diferentes vozes e investir na contextualização humanizada, que toque de alguma forma os públicos. É claro que há limites no fazer jornalístico e que nenhuma reportagem dará conta de tudo, entretanto, bons exemplos como esse, publicados frequentemente, contribuem com a formação e percepção ambiental da sociedade. Porque a crise climática, como bem lembra a reportagem, diz respeito, sobretudo, a nossa vida na Terra: “Vamos salvar a nós mesmos. Porque o planeta sobrevive. Se eu eliminar a espécie humana, a Terra volta ao equilíbrio e vive ainda bilhões de anos. E nós, será que conseguimos sobreviver se continuarmos a fazer o que estamos fazendo?” (ZH, Caderno doc, 12 e 13/10/19, p.11).
Referência:
WENZEL, Andrea; GERSON, Daniela; MORENO, Evelyn. Engaging Communities Through Solutions Journalism, 2016.
* Jornalista, mestre em Comunicação e Informação, e doutora em Meio Ambiente e Desenvolvimento. Vice-líder do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS).