Um olho no peixe da camada de ozônio, outro no gato da crise climática

Imagem de satélite da terra à noite. Fonte: Joshua Stevens / NASA / Miguel Román / Goddard Flight Center

Por Cláudia Herte de Moraes *

A cobertura jornalística sobre a recuperação da camada de ozônio em 16 de setembro, embora positiva e informativa, ainda carece de uma contextualização que conecte o tema de forma aprofundada às mudanças globais e à noção de limites planetários. Nas notícias do Dia Internacional para Preservação da Camada de Ozônio, a informação divulgada pelo Relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM) mostra que a região da estratosfera atingiu os seus melhores níveis em décadas.

 Ao observar as notícias, o ponto fraco foi a falta de explicação sobre o fato de que a camada de ozônio é apenas um dos limites que a humanidade está conseguindo reverter. Entre os nove limites planetários, seis foram ultrapassados, como a perda da biodiversidade, as mudanças climáticas, mudanças no uso do solo (especialmente por desmatamento e urbanização), fluxos bioquímicos (contaminação por fósforo e nitrogênio devido ao uso excessivo de fertilizantes), novas entidades (por exemplo, microplásticos) e uso de água doce (já em níveis críticos). A acidificação dos oceanos é um dos limites próximos da violação e somente dois são considerados seguros: além do ozônio estratosférico, está a carga de aerossóis.

Print de tela na busca das principais notícias sobre o tema (17 de set. 2025) Fonte: Autora

A contextualização importa para que o leitor entenda que o enfrentamento à crise ambiental é interconectado; são limites interdependentes. No caso do G1, a matéria indica o avanço de forma celebrativa, com uso das fontes oficiais, sem fazer essa conexão com outros limites planetários de alto risco. 

A abordagem fragmentada em notícias pode gerar uma percepção equivocada de que “o meio ambiente está sendo consertado”, diminuindo a urgência de ações em outras frentes. O jornalismo, neste caso, perde a oportunidade de exercer sua função educativa, sem trazer as conexões entre causas e consequências de forma abrangente. 

Outro ponto de atenção no trabalho jornalístico é que as fontes oficiais são essenciais, como a ONU e os dados científicos, porém é preciso lembrar das populações que podem ser atingidas ou que já sofreram com os efeitos de impactos ambientais noticiados. Por exemplo, seria o caso de trazer à memória do público o que a luta contra a destruição da camada de ozônio mobilizou milhares de cientistas, ativistas, movimentos socioambientais de décadas atrás e que, por conta dessa pressão, os acordos foram efetivados. Um texto bem posicionado neste sentido foi da Deutsche Welle, publicado no portal Terra: A história de sucesso da recuperação da camada de ozônio.

Aproximar esse tema do leitor é uma indicação importante para que as pessoas percebam a relevância dos fatos em seu cotidiano. A menção, por exemplo, sobre como a recuperação da camada de ozônio impacta as taxas de câncer de pele no Brasil foi lembrada, mas outras questões que afligem nosso país poderiam ser destacadas. Por que não usar esse exemplo de cooperação global para inspirar as soluções locais, mostrando como a agricultura pode se organizar para secas ou enchentes? 

Por fim, a cobertura peca ao olhar apenas para o passado, celebrando o sucesso do Protocolo de Montreal. Porém, ao pensarmos sob o princípio da precaução, que orienta o jornalismo a olhar para o futuro e alertar sobre novos riscos, a conquista histórica pode ser um importante alerta: quais as novas substâncias químicas não regulamentadas podem ameaçar a atmosfera? Como os substitutos dos CFCs (os HFCs) impactam o aquecimento global? Como observar as conexões entre os limites planetários que ainda necessitam de cuidado, regulamentação, regeneração? Celebrar o passado não pode ofuscar a necessidade de vigilância para o futuro.

* Jornalista, doutora em Comunicação e Informação, professora na UFSM. Tutora do PET Educom Clima (UFSM) e líder do Grupo Educom Clima (CNPq/UFSM). Integrante do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS) e do Laboratório de Comunicação Climática.
E-mail: claudia.moraes@ufsm.br

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