
Por Nico Costamilan* e Eloisa Beling Loose**
Em preparação para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-30), que será sediada em Belém, no Pará (PA), o jornalismo brasileiro apresenta iniciativas para informar o público sobre o evento sob diferentes perspectivas: econômica, política, ambiental, social, cultural, entre outras. Similar ao que ocorreu na Rio-92 (Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento) e na Rio+10 (Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável), reconhece-se um esforço de organizações jornalísticas e não jornalísticas para ampliar o debate ambiental e, em alguns casos, qualificar a cobertura sobre a COP.
Veículos com linhas editoriais diferentes, sobretudo independentes e/ou especializados, procuram informar de modo educativo sobre o que é a Conferência, sua função e o que se pode esperar da sua realização no Brasil. Projetos como podcasts exclusivos sobre o evento, bem como episódios específicos sobre o tema crescem em número nas plataformas digitais.
O podcast “Tempo Quente”, criado em 2022 pela Rádio Novelo para falar de mudanças climáticas, por exemplo, realiza nesse ano o especial “Esquenta pra COP30”, em parceria com a Agência Pública e o Observatório do Clima. Outros podcasts e programas que evidenciam essa preocupação com o entendimento do evento e o que está por trás de sua realização (o enfrentamento das mudanças climáticas) são: “COP Meio Cheio, Meio Vazio”, do Brazil Journal; “Entrando no Clima”, do ((o))eco; “Las Niñas”, de Carol Prolo e Natalie Unterstell. Dentre os temas mais abordados, estão: o financiamento climático, a governança global, o papel dos combustíveis fósseis, a transição energética e o protagonismo de comunidades tradicionais na tomada de decisões pelo clima.
Entre veículos públicos, como a EBC (Empresa Brasil de Comunicação), que será emissora anfitriã, estão sendo intensificadas a produção de conteúdos especiais em preparação para a COP-30, em novembro em Belém (PA). A mobilização da EBC inclui parcerias, como o acordo com a Funtelpa (Fundação Paraense de Radiodifusão), para ampliar o alcance da cobertura; a veiculação de interprogramas na TV Brasil sobre os biomas brasileiros; reportagens especiais nos telejornais; programas temáticos e boletins nas rádios; e iniciativas nas redes sociais e veículos governamentais.
Presente de forma recorrente na programação de programas diários como O Assunto, do G1, e Café da Manhã, da Folha de S. Paulo, a COP-30 está sendo mais discutida e evidenciada pelo jornalismo tradicional do que em edições anteriores. Isso se deve ao ineditismo de sua realização na Amazônia brasileira e também ao foco internacional que as decisões pró-ambiente ganham.
Veículos independentes, como ((o))eco, Sumaúma e Agência Pública, debruçam-se sobre aspectos nem sempre presentes na cobertura oficial do evento, bastante atreladas às fontes políticas. Em matéria da última semana de Lorena de Paula, o Sumaúma tratou da desigualdade em Belém e como ela implica até na diferença de calor sofrido pelos moradores da cidade. Segundo dados da reportagem “Na Belém da COP30, até a sombra é desigual”, há uma diferença de até 8 graus Celsius entre bairros ricos e pobres na capital paraense.
Em notícia assinada por Cristiane Prizibisczki no veículo ((o))eco em julho, o leilão realizado pela Agência Nacional de Petróleo é destacado junto à fala da presidência brasileira da COP sobre transição energética. Na publicação “Em semana de leilão de petróleo, Brasil fala à comunidade internacional sobre transição energética” as informações da semana foram apresentadas com questionamentos de enfrentamento às contradições políticas e econômicas.
Por ser uma profissão orientada para a factualidade, na qual a questão “tempo” é fator de decisão sobre as pautas, as expressões “em ano de COP”, “a x meses da COP” ou “a poucas semanas da COP” têm sido usadas de maneira repetida e quase clichê pelos jornalistas em 2025. No entanto, esse momentus pode ser útil para popularizar a problematização de questões ambientais com mais espaço midiático do que tradicionalmente identificamos. A partir disso, iniciativas independentes dão exemplo de contextualização e questionamento jornalístico diante de notícias e reportagens rasas e declaratórias na mídia hegemônica.
Foco na cobertura jornalística
A poucas semanas da COP-30 em Belém, intensificam-se as menções ao evento na mídia. Em meio à problemas logísticos, bate-bocas diplomáticos, crises políticas internas e projetos ambientais numerosos, é fácil que um comunicador perca de vista suas prioridades na hora da cobertura e se disperse quanto à pautas, fontes e abordagens. Visando a complexidade que é cobrir um evento de tal magnitude, diversas entidades, organizações e associações jornalísticas organizaram ao longo do ano iniciativas para a preparação de profissionais.
Entre alguns projetos mapeados estão cursos online, seminários, webnários, palestras, materiais e guias para os jornalistas interessados. A grande maioria dessas iniciativas é produzida por veículos independentes, organizações não-governamentais e associações de jornalismo.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), em parceria com a Transparência Internacional e da Agence Française de Développement, disponibilizou ao final de 2024 um curso gratuito sobre democracia ambiental e climática, com o objetivo de preparar para a COP. Neste ano, a Abraji disponibilizou também o curso “COP30 em pauta”, com apoio do Itaú e do site ((o))eco.
Outras formações com o mesmo objetivo foram “COP30: o essencial para cobrir o evento”, da InfoAmazônia, “Cobertura climática e COPs: ferramentas, fontes e narrativas para jornalistas e comunicadores”, da Knight Center, e “Mudanças Climáticas: Agricultura na era da produtividade e sustentabilidade, da Embrapa e do Sebrae.
Entre os desafios da cobertura está a desinformação, que se espalha com o objetivo de manipular grupos, sustentar teorias conspiratórias, desacreditar figuras públicas ou movimentos políticos e até gerar lucro por meio de cliques. Seus impactos podem ser graves e podem influenciar percepções sobre temas cruciais, como a crise climática. Em momentos decisivos como a conferência em Belém seus efeitos tornam-se ainda mais perigosos, exigindo que jornalistas redobrem a atenção diante das redes. Pensando nisso, a Agência France-Presse (AFP), promove atualmente um treinamento online sobre desinformação climática para jornalistas com apoio da Embaixada da França no Brasil.
Além de formações online, iniciativas presenciais especializadas também vêm ocorrendo neste ano, como as Formações para Comunicadores Populares das Baixadas de Belém, pelo Na Cuia e o Fundo Casa Socioambiental.
Com seminários, o Instituto Clima e Sociedade; o Observatório da Imprensa, a Associação Brasileira de Imprensa e Federação das Indústrias do Estado do Pará também realizaram ações para jornalistas.
O Pulitzer Center abriu uma chamada especial no início de 2025 para propostas de subsídios voltadas à cobertura da COP30. Jornalistas, editores e veículos de mídia independentes puderam enviar projetos que abordem temas ambientais considerados essenciais para a conferência.
A Associação de Jornalismo Digital, em parceria com a InfoAmazonia e com o Instituto Serrapilheira lançou em maio o edital “Sala Colaborativa: Construção de Coberturas Socioambientais no ano da COP no Brasil”, projeto para produção de pautas e produção jornalística sobre questões socioambientais, focados nos estados da Amazônia Legal.
Outra iniciativa é a “Central Belém: Clima com a Natureza na COP30”, criada pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS) em parceria com Nature4Climate, The Nature Conservancy Brasil e o PNUMA, que busca apoiar e conectar jornalistas na sua cobertura do evento. O projeto oferece suporte editorial, acesso a especialistas e fontes locais, além de oficinas, webinars e visitas de campo. A proposta é fortalecer narrativas que deem visibilidade a vozes diversas e ampliem a compreensão global sobre o papel da Amazônia nas soluções climáticas.
Ações para o público
Além de formações para comunicadores, organizações e universidades planejaram iniciativas voltadas para todos os interessados no evento, com diferentes enfoques pelo Brasil. O Fundo Casa Socioambiental e a Rede Comuá lançaram a publicação “Rumo à COP 30”, guia voltado especialmente para comunidades locais, povos tradicionais, periferias urbanas periféricas, comunicadores, jornalistas, educadores populares e o público em geral.
O Observatório do Clima, com o projeto nacional Estação Central da COP, convidou a criação de espaços de informação e formação para grupos diversos (escolas, comunidades, coletivos, etc.) sobre a Conferência através de materiais e orientações disponibilizadas.
Além disso, ao longo de 2025 ocorrem iniciativas de universidades, como o podcast “Vozes do Clima” do PET Educom Clima da UFSM, e o “De olho na COP”, do Observatório de Jornalismo Ambiental do Grupo de Pesquisa em Jornalismo (CNPq/UFRGS), também em parceria com o PET Educom Clima. Esses dois projetos procuram, através do jornalismo e da extensão universitária, aproximar a comunidade dos debates e discussões que acontecerão na COP-30, e que perpassam a sua realização.
Dentre a parcela de iniciativas mencionada, percebe-se a valorização do jornalismo independente, de veículos e organizações comunitárias, locais e especializadas em comunicação engajada com a causa ambiental. É possível notar, também, preocupação com uma cobertura qualificada, aprofundada e consciente da COP-30.
*Nico Costamilan é estudante de graduação em Jornalismo na UFRGS, bolsista de extensão do Grupo de Pesquisa em Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS) e bolsista voluntária do Laboratório de Comunicação Climática (CNPq/UFRGS). Email: nicocostamilan@gmail.com
**Eloisa Beling Loose é professora do Departamento de Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Integrante do Grupo e Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS) e coordenadora do Laboratório de Comunicação Climática (CNPq/UFRGS). E-mail: eloisa.loose@ufrgs.br.
