Enquanto o mundo pega fogo, o jornalismo apaga incêndios localizados

Por Carine Massierer*

Há uma dissonância entre os desastres ambientais decorrentes das mudanças climáticas e a forma como o jornalismo vêm noticiando estes acontecimentos. Enquanto o mundo pega fogo, literalmente, os principais veículos de comunicação do Brasil e do Mundo publicam matérias rasas que dão conta de apenas relatar os eventos climáticos e o número de pessoas foram afetadas. Mesmo que um jornalismo sistêmico e baseado na pluralidade de vozes ainda esteja distante, é necessário, no mínimo, o compromisso de garantir a informação e ser instrumento de transformação social.

Tivemos um JULHO DE EXTREMOS no hemisfério norte com ondas após ondas de calor com recordes, incêndios florestais e inundações ao mesmo tempo e isto está retratado nas matérias que são indexadas. As principais notícias da semana evidenciam o aquecimento global e seus impactos na vida de milhões de pessoas no mundo, e é inegável a ampliação de matérias sobre o tema nos últimos tempos.

Das matérias que mais se destacam está a que trata de Mudanças climáticas e da possibilidade de extinção humana, produzida e publicada pela BBC Brasileira. Ela foi replicada em vários outros espaços de comunicação como os sites G1, Uol, Yahoo, dentre outros tantos que copiaram o conteúdo.

Imagem: Captura de tela do site BBC em 06 de agosto de 2022.

A matéria traz os possíveis resultados catastróficos das mudanças climáticas, mas o novo estudo, que já é citado no primeiro parágrafo, não tem nem o nome colocado na publicação e não é esclarecido onde ele foi publicado, com qual o objetivo e os autores. Somente na última linha consta “O estudo foi publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences”. Ou seja, vemos a reprodução de um conteúdo que tem muitas falhas e que as demais empresas de comunicação se limitam a copiar. Já no site Olhar Digital (Informação é a melhor arma contra a crise climática, diz relatório (olhardigital.com.br), o relatório é mencionado logo ao início, reforçando a necessidade de consideração dos piores cenários e elaboração de um esquema tático efetivo sobre o que fazer se — ou quando — o nosso modo de vida atual desmoronar. 

 

Tendo em conta a importância da comunicação e do jornalismo para a tomada de decisões assertivas, mudanças de atitudes e apoio à ação climática, é preciso que sejam aprofundados os usos e explicitação quanto à mitigação e à adaptação climáticas nas matérias jornalísticas para que reverberem na tomada de atitude dos seres humanos. Há ainda um descompasso entre a realidade de um mundo que está pegando fogo e as preocupações em pauta nas empresas de comunicação que ainda estão tratando os incêndios de forma localizada e não ampliando e qualificando com mais informações os conteúdos publicados.  Isto tudo decorre do foco do campo comunicacional,ainda centrado nos efeitos da crise climática mais do que em possíveis soluções para seu enfrentamento.

 

 

*Carine Massierer é jornalista, mestre em Comunicação e Informação pela UFRGS e integrante do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS).

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