
Imagem: o candidato Lula em campanha com indígenas em Belém (PA) – Foto: Divulgação/Ricardo Stuckert
Por Sérgio Pereira*
É impossível determinar o quanto o tema “meio ambiente” influenciou na escolha por Luiz Inácio Lula da Silva, presidente eleito por mais de 60 milhões de brasileiros. Afinal, o voto é secreto. Há algumas elementos, no entanto, que podem ajudar a mensurar quais foram os principais interesses do eleitor neste pleito de 2022.
Uma dessas ferramentas é uma pesquisa divulgada pelo Datafolha no início de setembro sobre as questões mais importantes para o eleitorado na hora de se definir entre os postulantes à Presidência. O formulário do levantamento, no entanto, relaciona apenas seis assuntos e não questiona os entrevistados sobre meio ambiente, conforme dados disponíveis no site do Tribunal Superior Eleitoral.
Aqui, permita-me um parêntese: o instituto de pesquisa poderia ter definido apenas temas genéricos no questionário aplicado, como educação, saúde, transporte, segurança ou meio ambiente. Ao contrário, colocou no levantamento três pautas gerais e outras três que faziam parte da campanha do candidato da extrema direita: defesa dos valores da família; combate à corrupção; e combate à violência. Já plataformas defendidas pelos candidatos da esquerda, como combate à fome, inclusão social ou defesa da Amazônia, por exemplo, foram ignoradas.
Nesta pesquisa, os entrevistados elencaram como suas principais preocupações eleitorais a saúde, com 34%; educação, com 24%; e emprego e renda, com 17%. O combate à corrupção aparece em quarto lugar, com apenas 10% de interesse; seguido da defesa dos valores da família, com 7%; e combate à violência, com 6%.
Outra pesquisa foi elaborada no início de setembro, quando o PoderData entrevistou 3.000 pessoas sobre a importância da Amazônia para o desenvolvimento da economia brasileira, sendo que 74% responderam afirmativamente. O levantamento encomendado pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS), no entanto, fixou-se apenas no Bioma Amazônico, com um viés econômico e sem perguntar até que ponto esse item influenciaria na hora do voto, não sendo possível, portanto, utilizá-lo como indicador nesta breve pesquisa.
Um novo instrumento que nos auxilia a medir o interesse sobre determinados temas, mesmo que seja de uso restrito, é o Google Trends (GT). Para quem não se aventurou ainda a usar, o GT é “uma ferramenta de avaliação de dados que permite que os usuários personalizem as pesquisas por termos e frases relevantes e monitorem as tendências de SEO (Search Engine Optimization ou otimização de mecanismos de busca) em qualquer período definido”, conforme definição da própria plataforma.
Em outubro, o GT disponibilizou um levantamento sobre os principais assuntos pesquisados envolvendo os dois candidatos do segundo turno. Importante destacar que a aba ainda está ativa e continua sendo atualizada.
Os internautas, quando pesquisaram sobre Lula nos últimos 90 dias, procuraram respostas para questões como o boné usado pelo candidato em determinado dia da campanha com as letras “CPX” (que significam “complexo do Alemão”, mas que foi usado como fake News por parte do adversário como sendo de uma facção criminosa) ou sobre a participação do ex-presidente em entrevistas, como no Programa do Ratinho ou no podcast Flow.
Já sobre Jair Bolsonaro, no mesmo período, as 25 principais consultas envolveram pontos com “pintou um clima” ou “pedófilo” (sobre um comentário feito sobre um momento de campanha em que encontrou meninas venezuelanas entre 14 e 15 anos), “canibal” (outra declaração mais antiga sobre episódio em que se mostrou interessado em comer um indígena), além de participações suas em programas de entrevistas.
Nos dois casos, nada envolvendo assuntos da esfera ambiental, o que já é revelador sobre o desinteresse do eleitor pelo assunto.
Um dos objetivos da imprensa é despertar a sociedade sobre assuntos que são relevantes. Em rápida análise sobre o principal jornal do RS, é possível constatar que Zero Hora divulgou pelo menos sete matérias envolvendo “eleições e meio ambiente” em outubro, durante a campanha do segundo turno. Entre elas, um texto tratando do desmatamento na Amazônia no governo atual e em outra comparando propostas dos dois candidatos sobre diversos temas e entre eles foi incluído o meio ambiente. Ou seja, não houve omissão por parte de ZH, mas o jornal poderia ter explorado mais o assunto por sua importância não apenas para os brasileiros, mas para todo o mundo.
Pode-se afirmar que a vitória de Lula passa por uma série de fatores. Pautas como combate à fome, mais empregos e defesa da democracia foram fundamentais neste processo eleitoral. Mas a estratégia equivocada de Bolsonaro durante a pandemia da Covid-19, sua total inabilidade para tratar os principais problemas nacionais e seu estilo insultuoso também pesaram na decisão do eleitor. Não há indícios, porém, para afirmar que os temas ambientais foram decisivos para a grande maioria do eleitorado brasileiro, infelizmente. Mesmo assim, os 60 milhões de brasileiros que miraram em outros interesses acabaram por dar um basta à política devastadora de Bolsonaro. Mais quatro anos poderiam ser irreversíveis e, por isso, o mundo agradece.
*Jornalista, servidor público, mestrando em Comunicação e Informação pela UFRGS e integrante do Grupo de Pesquisa Jornalismo e Meio ambiente