Jornalismo ambiental não hegemônico prova seu impacto no debate público

Imagem: Após reportagem de ((o))eco, condenado por assassinato de Chico Mendes é destituído de presidência do Partido Liberal (PL) / Arquivo Memorial Chico Mendes

Por Débora Gallas*

Uma reportagem do site ((o)) eco publicada no dia 27 de fevereiro repercutiu em outros veículos brasileiros de projeção nacional e impactou as decisões de uma das maiores forças políticas do Brasil – o Partido Liberal (PL). O texto da jornalista Cristiane Prizibisczki revelou que Darci Alves Pereira, condenado pela execução do seringueiro e ambientalista Chico Mendes, havia assumido a presidência do PL em Medicilândia, no Pará.

O caso, informado primeiramente por um veículo não hegemônico, foi notícia em seguida em veículos como GloboNews. No mesmo dia, diante das críticas ao PL, o presidente do partido, Valdemar Costa Neto, recomendou a destituição de Darci Alves Pereira do cargo. Os desdobramentos também foram noticiados por diversos veículos de jornalismo hegemônico de projeção nacional, como UOL e g1.

A polêmica também rendeu matérias sobre o tema por outros ângulos: O Povo, por exemplo, explica que, após o cumprimento da pena pelo crime realizado em Xapuri, no Acre em 1988, Darci se estabeleceu no Pará e passou a ser conhecido como “Pastor Daniel”. O Globo relembrou as circunstâncias e motivações do assassinato. Já a CNN aproveitou o gancho para explicar às novas gerações quem foi Chico Mendes e qual foi o legado de sua luta pela conservação ambiental e pelo uso sustentável dos bens naturais.

Quando nos referimos ao jornalismo não hegemônico, recorremos ao entendimento da pesquisadora Eloisa Loose. Segundo a autora, essa modalidade é praticada por meios que não dominam o mercado e que são mais propensos a adotar posicionamentos críticos. A definição de jornalismo não hegemônico tem similaridades com as ideias de jornalismo alternativo ou jornalismo independente – embora não sejam sinônimos – porque subvertem as preocupações comerciais vistas no jornalismo comumente denominado hegemônico, tradicional ou mainstream.

A autonomia e a independência do jornalismo não hegemônico em relação a anunciantes, por exemplo, são positivas sobretudo para a prática do jornalismo ambiental, que com frequência confronta interesses políticos e econômicos que ameaçam os ecossistemas e os seres humanos e não humanos.

A partir da apuração de ((o)) eco e da repercussão da informação sobre a entrada de Darci Alves Pereira na política, entendemos que o jornalismo não hegemônico não está reduzido a um nicho de público, com alcance limitado. Esse tipo de jornalismo, sobretudo no caso de pautas ambientais – que passaram a ser vistas como “hard news” muito recentemente – tem potencial de impactar o ecossistema do próprio jornalismo e, mais amplamente, o debate público e as decisões de atores relevantes.

* Jornalista, doutora em Comunicação e Informação, integrante do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS).

Referências

GIRARDI, I. M. T.; LOOSE, E. B.; STEIGLEDER, D. G.; MASSIERER, C. Meio ambiente no Jornal Nacional: das tragédias às disputas políticas. Animus. Revista Interamericana de Comunicação Midiática, v. 22, n. 48, 2023. DOI: 10.5902/2175497768800.

LOOSE, Eloisa Beling. Jornalismo e mudanças climáticas desde o Sul: Os vínculos do jornalismo não hegemônico com a colonialidade. Porto Alegre: UFRGS, 2021. Tese de doutorado disponível em: https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/220347/001124549.pdf.