Imagem: Captura de tela – Reportagem de Daniela Chiaretti publicada no site do jornal Valor Econômico
Por Débora Gallas Steigleder*
A Lei de Proteção da Vegetação Nativa, popularmente denominada Código Florestal, sancionada em 2012 pela presidenta Dilma Rousseff após mais de uma década de debates no Congresso Nacional, voltou à pauta no último mês. Isto porque os senadores Flávio Bolsonaro (PSL/RJ) e colega Marcio Bittar (MDB/AC) apresentaram o Projeto de Lei 2362/2019, que propõe o fim da reserva legal nos imóveis rurais de todo o País.
Publicada em 29 de abril no site do jornal Valor Econômico, a reportagem da jornalista Daniela Chiaretti busca traduzir o impacto da aprovação da proposta. O título dá destaque aos números, como é de se esperar de um veículo que costuma repercutir e informar o mercado financeiro, mas permite ao leitor visualizar a dimensão das áreas afetadas ao equivalê-las à área de “três Bahias”.
Ao longo do texto, a repórter aborda os principais pontos do PL, marcado por afirmações desprovidas de embasamento, tais como a de que o Brasil é “um dos [países] que mais preserva sua vegetação no mundo”. Tais afirmações são contrapostas às análises de uma fonte especializada, um pesquisador, cuja relevância diante do tema é justificada pela jornalista logo após o lead.
Esta postura proativa, de prezar a apuração jornalística frente à mera reprodução de versões das fontes oficiais, é um aspecto pouco verificado nas diversas pesquisas do Grupo de Pesquisa em Jornalismo Ambiental (GPJA) sobre coberturas da mídia hegemônica** e, portanto, deve ser incentivado. Isto porque um dos princípios-chave do jornalismo ambiental é sua preocupação com o ambiente enquanto bem comum.
Na continuidade da cobertura, valeria trazer mais vozes ao texto para reforçar a complexidade do tema. A fonte especialista tem autoridade a partir do seu saber científico, mas diversos outros atores sociais também podem argumentar contra a proposta a partir de seus saberes. Porém, de forma geral, a cobertura está alinhada com o jornalismo ambiental ao já partir do pressuposto de que o PL é prejudicial à biodiversidade e à qualidade de vida das comunidades humanas. E esta postura deve ser assumida por todos os jornalismos, tanto os hegemônicos quanto os especializados em economia e finanças.
* Jornalista, doutoranda em Comunicação na Universidade Federal do Rio Grande do Sul com bolsa Capes. Integrante do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS).
** Uma das mais recentes publicações do Grupo atenta para a importância de envolver outros atores para além do Estado na discussão sobre possíveis soluções para situações de injustiça ambiental. Ver em: GIRARDI, Ilza Maria Tourinho; STEIGLEDER, Débora Gallas; SILVA, Jamille Almeida da; LOOSE, Eloisa Beling. Injusticia ambiental en el periodismo: análisis de reportajes sobre contaminación por pesticidas. La trama de la comunicación, Rosario (Argentina), v.23, n.1, p.15-29, jan./jul. 2019.
Um comentário em “Por que o jornalismo deve se posicionar diante da ameaça à vegetação nativa no Brasil”